25/07/2015

Memórias - Tomate

O meu Pai “gabava-se” de nunca ter comido tomate cru e até tinha uma espécie de graçola com o meu Avô materno, a este propósito. O meu Avô dizia , por brincadeira, à minha Mãe que não tinha servido salada de tomate ao meu Pai, ao que este respondia: Obrigado Pai Zuzarte, hoje não me apetece!

Assim começam estas histórias das minhas comidas, que irão mostrar a maioria dessas minhas raízes na família materna, gente de cozinhar e de comer bem.


O doce de tomate da Avó Celeste(e da minha Mãe) era das coisas mais saborosas de sempre e para mim, na versão ideal, apresenta-se num papo-seco barrado com manteiga, sobre a qual se deita o doce. Quando este tem pedaços cristalizados é ainda melhor, mas isso era no tempo em que os doces levavam muito açúcar, para assim durarem mais e animarem refeições futuras.  

Com tomate faz-se também o arroz de tomate, uma das poucas coisas que eu tentava evitar – em vão, já que o meu Avô dizia que tudo o que ia para a mesa era bom e para comer – pois a minha Avó tinha por costume fazer esse arroz na sua versão seca.
No entanto viria do tomate a solução para o problema. Por acaso, ou melhor, inevitavelmente, descobri que aquele maravilhoso caldo que se forma na saladeira, mistura de azeite, vinagre, sal e a água do tomate, quando deitado sobre o tal arroz (seco) de tomate, dava-lha uma vida nova, à qual aderi de imediato. E assim avancei.

O arroz de tomate malandrinho é bom, mas o solto, de levar para o pinhal e comer horas depois é uma coisa com memórias fundas e com o tal caldinho então, é um milagre.
Hoje, no dia-a-dia, recordo mais o molho da salada, que o doce de tomate ou o arroz seco, e dou por mim a comê-lo com pão. Também porque essa é a essência dos gaspachos de tomate, as recordações têm muitos cantos de onde surgir.

Havia ainda nesses tempos passados, a calda de tomate que a minha Avó preparava, quando os ditos "pomodoros" amadureciam. Então fazia muitos litros da dita calda, que seria usada durante os meses do outono e inverno, nas comidas que necessitavam de tomate. Outros tempos, em que se comia apenas o que havia nas redondezas, mas isso acontecia de forma natural e não por principios morais ou ecológicos. Comer local era a regra e o único produto remoto era então o bacalhau.

Muito mais recente, é a memória de ver a minha filha espantada com o bom sabor dumas rodelas grossas de tomate coração de boi, temperadas com sal grosso, azeite e oregãos, comidas numa noite de Agosto em Villablanca, nos arredores de Ayamonte:
- Pai, o que tem este tomate que é tão bom?

Ela não se lembra, mas para mim foi emocionante



A imagem veio do blog Chucrute com Salsicha  

4 comments:

  1. Obrigada por memórias que nos trazem as nossas próprias memórias (de tomate com sal na beira-rio em tardes de Verão, do molho da salada com pão e dos lanches partilhados que ainda proporciona de vez em quando). E obrigada por receitas que nunca comentei!

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    1. Em teoria, esta ideia das memórias associadas às comidas pode parecer um exagero e muita conversa para pouca coisa, mas na verdade, quando se começa a puxar pelas pequenas ideias, sai de lá mais do que se espera. Há mesmo memórias enterradas que reaparecem - neste caso foi a calda de tomate da minha avó...e obrigado por comentar.

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  2. Tenho a certeza de que nos separam centenas de quilómetros e talvez uns anitos e que as nossas infâncias foram tudo menos parecidas mas daqui também recordo memórias do doce de tomate (que ainda faço) para gastar o excesso e de frascos cheios de molho de tomate cobertos com uma camada de azeite para se ir gastando de inverno, até porque por aqui só havia a 'loja' com produtos básicos cuja soma se ía apontando num livrinho e se pagava ao fim do mês, no dia do meu pai receber :)

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  3. Num país tão pequeno e que anda(va) a uma velocidade tão lenta, as memórias sobrepõem-se, completam-se e compreendem-se porque partilham muita coisa.

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