16/06/2018

Em Vila Verde de Ficalho chamam-lhe Caspacho

De tanto ouvir o meu amigo Luís Ventura falar do "caspacho" da sua Vila Verde de Ficalho, já me crescia água na boca, mas nada que me preparasse para os sabores com que essa "simples"  sopa fria se apresentou.

O Luís sorri sempre que fala nos seus petiscos e isso é coisa que eu entendo muito bem, O amor do que nos é próximo, da terra e da família, aliado ao conhecimento dos bons productos e do tempo próprio para os usar, faz do mais modesto prato, uma iguaria de trazer memórias, emoções e dar vida a quem já não está connosco. Nesta caso, o Luís falou várias vezes de sua Avó e, como  eu também amiúde sinto a presença da minha enquanto cozinho, deixei-me levar nesse abraço e assim cheguei à mesa e aos sabores do Verão no Baixo Alentejo.

O orgulho nos productos apresentados no seu melhor, sendo neste caso o tomate quem tinha direito a destaque, é a base desta  e de outras preparações.

 Sem tomate bem vermelho do sol, nem vale a pena começar.

Mesmo o utensílio usado, uma espécie de pilão com a forma duma maçaneta de porta, feito em madeira e a que se acrescentou um pau a fazer de pega, mereceu a chamada de atenção do Luís.

O "bate-bate", fora feito em Ficalho e imagino que fosse cópia do que sua Avó usara vezes sem conta para fazer este mesmo caspacho e outros pisos, adequados  à tradição culinária da região.
Foi pelo piso de alho que a coisa começou.  Depois de bem esmagados uns quatro dentes de alho, juntou-se-lhes o (meio?) pimento verde em cubos mínimos, igualmente esmagados com paciência e rigor. Depois foi a vez do tomate - um inteiro a que apenas faltava a pele , também esmagado para fazer parte daquela papa que ia tomando sabor.
A essa base juntaram-se pequenos cubos de tomate, pepino e para surpresa minha batata cozida, esta  já em bocados de bom tamanho(ver a foto), pão duro alentejano em pedaços irregulares, "beliscados" como diz o Luís, o vinagre e o excelente azeite de Ficalho adicionados sem medo e com uma arte que deve ser genética, pois aquilo que me parecia excessivo, acabou por ser o jóia da coroa, pois a presença forte do tempero é fundamental para que, aquela espécie de salada de tomate com água, atingisse toda a sua glória.

Eu levei uns jaquinzinhos que depois de fritos fizeram boa figura ao lado do caspacho, e isso tenho de agradecer à Bela, que tem sempre peixe de qualidade na sua banca em Alvalade.

Foi uma tarde de feriado muito bem passada, em boa companhia, com boa comida e bebida, enquanto na rua tudo cheirava às sardinhas do Santo António. Se à ida me fugia o pé para a sardinha, no regresso já reconfortado, na minha cabeça ecoavam os sabores do nosso almoço e nada mais.

10/06/2018

Para variar é arroz de peixe

Arroz de peixe é o prato que mais gosto de fazer.

A versão que aprendi com a Chef Noélia Jerónimo é a minha preferida, principalmente quando feita por ela... 
Isto não é uma graçola, porque sempre que a peço no seu restaurante nas Cabanas, ela diz que eu já o sei fazer e devia pedir outra coisa. Ora bem, eu sei fazer o arroz de limão com corvina (ou outro peixe branco e bom) seguindo a receita dela, que até apareceu nesta minha colecção de histórias e receitas, mas nunca consegui fazer tão bem como ela. Eu faço bem, mas a Chef faz um arroz de limão perfeito.

Esse arroz que já me valeu muitos elogios, é um louvor à simplicidade e o nome é quase a receita completa. Mas há outras versões do pitéu, algumas boas, outras nem por isso, principalmente porque muitas pessoas se esquecem que a coisa é sobre peixe e arroz, o resto são adereços.

Gosto muito de arroz de peixe, e recordo com frequência um dos que a minha Mãe fazia e todos apreciavam, apesar das espinhas, o Arroz de Safio.  Este,  com o seu quê de tomate e a incontornável presença do pimento, era prato de Verão na nossa casa e, mesmo sendo o safio tão diferente na textura, no sabor e nas suas imprevisíveis espinhas, era do agrado geral e gosto de o trazer de volta, sem planos, mas quando calha e o dito peixe me aparece no caminho.

Ontem fui à praça a pensar em caldeirada, mas os elogios da Bela à qualidade do safio fizeram-me regressar ao referido Arroz de Safio. Eu sei que ele apresentar-se na caldeirada, mas já me tinha decidido pelo arroz, e nem o pata-roxa que também trouxe me desviou do caminho.

Arroz de safio e pata-roxa

Comecei pelo caldo: cebola, cenoura, aipo, alho, louro, coentros, pimenta, cravinho, sal, água

Os vegetais suaram no azeite, juntei a água para fazer o caldo e depois deste começar a ferver, adicionei as postas de safio e pata-roxa, esperei que retomasse a fervura, tapei e apaguei o lume. 

Assim ficou tudo num banho quente que se prolongou por 25 ou 30 minutos.

Passado esse tempo, à que tirar o peixe da panela, remover peles e espinhas ( o pata-roxa já vinha esfolado e só tem espinha central...) e com essas partes não comestíveis adicionadas ao caldo, retomar o ligeiro fervilhar por mais 30 minutos.

Para fazer o arroz não fiz refogado, mas deitei cebola picada, tomate maduro  e pimento também picados na panela, reguei com azeite e assim que começou a aquecer, adicionei o arroz e o caldo coado (3 partes de caldo para 1 de arroz) tapei e dei inicio à cocção, mantendo o restante caldo à mão para poder adicionar se fizesse falta ( e fez)
Quanto ao peixe já limpo, juntei-lhe mais um pouco de cebola e tomate picados, hortelã, muitos coentros, malagueta em pó, azeite e deixei-o à espera de vez.
Passados 10 minutos de cozedura e porque o arroz começava a estar pobre em caldo, juntei mais um copo (total 4 copos de caldo) e entrou o peixe com os seus temperos crus. 
Levantar fervura, tapar e descansar 5 minutos que só lhe fazem bem

Chegados aqui, só falta comer, o que é tão importante como fazer. Comer, apreciar, repetir e mostrar alegria se for o caso. Este é o elogio pretendido.
Quanto a memórias, essas juntam os Avós, os Pais, as praias (primeiro a Nazaré, depois S. Martinho do Porto) as idas à praça, a sesta depois do almoço que ajudava a passar o tempo até à hora do banho e vão-se enriquecendo em cada repetição, juntando-se coisas novas, como os filhos, as caras alegres dos amigos, o orgulho de saber fazer e poder assim replicar os dias passados e fazer deles novos. 

(para a minha Mãe Teresa Maria)

04/06/2018

Fast Meals and Contemporary Cuisine - prova final

Amanhã tenho a prova final de Fast Meals & Contemporary Cuisine, com um tema singelo - Uma sandwich e uma salada - tão simples, tão vago, tão assustador...

Porque existe uma lista de ingredientes a que não podemos fugir, foi questão de olhar para a dita e tentar compor qualquer coisa, que não tem de ser original, mas tem de ser bom e identificável com o tema proposto. Esse é um problema que eu tenho, pois quero fazer um torricado, mas será que conta como sandwich? 

Será um torricado com escabeche de frango, ou se não puder ser, farei uma coisa aparentada ao  bahn mi.

Para a salada tenho as ideias mais assentes, e só espero ter os ingredientes todos, pois estes são limitados em quantidade e se todos quiserem couve-flor, batatas e nozes posso ter que improvisar ( ou combater pela posse, o que é pouco provável)

Precisarei de: batatas , couve-flor, cebolas, nozes, alcaparras, rúcula, alho, limão, manteiga, mayonnaise (que tenho de fazer), sal e pimenta  

Cozo as batatas e a couve-flor e reservo-as para que arrefeçam. Corto as cebolas em meias luas que saltearei até estarem bem douradas. Reservo em papel absorvente. 
Douro também as nozes, faço o mesmo com o alho e por fim, frito as alcaparras. 
Depois  de fazer a mayonnaise, esmago o alho e junto-o. Junto também algumas folhas de rúcula muito bem picadas, misturo tudo e corrijo o sal e o limão.
Uma vez a couve-flor e as batatas batatas arrefecidas (se for preciso uso o blast chiller) vão ao lume para corarem em manteiga.

O empratamento também é para levar a sério e conta para a nota final, por isso aqui vai.

Mayonnaise no fundo do prato e sobre esta algumas alcaparras ao acaso. Depois as batatas, cortadas ao meio para se equilibrarem, e os floretes de couve-flor arrumados nos espaços. As nozes juntam-se ao grupo e no fim entra a cebola, um pouco por todo o lado. 

Devo garantir que uma garfada ao acaso tem boas hipóteses de apanhar um pouco de tudo, e que tudo funciona harmoniosamente. Como as cebolas são doces, conto com a mayonnaise e as alcaparras para contrabalançar.

A foto é dum teste feito no fim de semana e não tem mayonnaise.

Agora falta decidir a sandes...

(já fiz a prova que correu bem, e o professor gostou do meu torricado com escabeche de frango, e apreciou a salada embora com algumas críticas por falta de mais contrastes - ou por eu ter tido receio de por mais alcaparras que ajudariam a colmatar essa falha. O sabor ácido e salgado das alcaparras devia estar mais presente para contrabalançar o adocicado dos vegetais caramelizados e da cebola frita...)