23/06/2016

Cozido é quando um homem quiser

Manda o figurino, que se interrompa a preparação dos “Cozidos” durante os meses do calor, coisa que sempre me entristeceu, principalmente porque não gosto de imposições. É triste chegar a uma casa onde se come bem, perguntar pelo cozido como quem pergunta pela família e responderem:

- nunca passa cá o verão, talvez lá para outubro!

Mas afinal, é por essas e por outras que eu aprendi a cozinhar, e se me negam o prato, vou a correr e faço-o. Além disso, um bom cozido de grão, com feijão verde, um nadinha de tomate e se possível algo de borrego, é coisa do verão, até porque rima.

Fiquei contente ao ler o recente escrito do LuísPontes sobre este tema e por isso, deixei que a gulodice dominasse.

Um cozido, mesmo de verão e mais ligeiro, precisa de planeamento. Que eu saiba, não se vende carne de porco salgada por aqui, é para isso é preciso começar dois dias antes. 
Fugindo à tentação do exagero a que se seguem demasiadas sobras, comprei apenas um naco pequeno de barriga de porco e um chispe também pequeno. Cobri-os de sal grosso e mandei-os descansar no frigorífico durante dois dias. Faz toda a diferença no sabor final das carnes e do caldo.

De enchidos usei apenas um chouriço de carne alentejano (linguiça, dizem eles) e uma farinheira também do Alentejo, que, com a excepção da morcela de arroz de Torres Novas, são os enchidos que mais gosto.

Lavei as carnes salgadas e cozi-as lentamente em água aromatizada com cebola, cenoura e alho (estes sairão depois, porque ficam quase desfeitos). A meio da cozedura entra o chouriço, já a farinheira fica para o final, pois coze rápido. 
Cozidas as carnes e coado o caldo, volta este último para o lume, com duas batatas,  três ou quatro cenouras e um tomate, por ser Verão.  Quando os legumes estão quase cozidos, junto o feijão-verde, o grão, que desta vez era de lata, as carnes desossadas e partidas, bem como umas rodelas de chouriço(sem exageros) . A farinheira espera, para não se desfazer, nem ofuscar tudo com o seu sabor forte.

Costumo usar hortelã, mas como a inspiração veio do Outras Comidas, usei a segurelha aí sugerida, que fica muito bem, e é uma erva que muito estimo por me recordar a minha avó Celeste…

Comi este cozido com muito caldo, sobre fatias finas de pão alentejano e soube-me a Verão, mesmo na falta de um pouco de borrego, que ficaria ali a matar!


Pastéis de massa tenra com cozido de grão e arroz de beldroegas


E os restos? Sim, que um homem só, não dá conta de nenhum cozido honesto. 
Pois bem, parti tudo em pequenos pedaços, fiz uma massa com 2 copos de farinha, 1 colher de sopa de banha de porco, umas areias de sal e um copo metade água, metade vinho branco (não usei o líquido todo).
Misturei farinha, banha e sal com as pontas dos dedos até estar a gordura bem incorporada e fui deitando líquido até ter uma bola homogénea. Descansou a massa no frigorífico durante 1 hora e depois foi só estender, rechear e fritar.

Para acompanhar os pastéis, voltei a improvisar e fiz um arroz de beldroegas com o resto do caldo do cozido. E vivam as beldroegas




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