O pão é um direito...
e não devia ser um mal de que se foge.
O pão já estava na nossa vida antes de nascermos e, se
hoje reconhecemos que já foi mais fácil encontrar bom pão, há que defender o
que resta e copiar quem o faz bem, em vez de nos entregarmos aos pré-cozidos e
congelados, esses que só se podem comer enquanto quentes e depois trazem os
efeitos esperados, as alergias, o enfartamento e todos os incómodos digestivos, pelas fermentações mal feitas e
outros atropelos à saúde pública, como o uso de químicos, que aceleram a moagem
do cereal e fico por aqui para não
estragar o apetite a ninguém
Mas ainda há bom pão em Portugal e é isso que
o coração nos pede. Não é com carcaças de soja ou bolinhas de malte que
chegamos ao Céu dos saciados.
E depois há bons queijos, algumas manteigas,
os doces caseiros, o presunto, a muxama e o molho.
Sobretudo o molho.
As primeiras sandes de molho que vi e comi, eram
feitas com o molho das iscas ou das bifanas. Comiam-se por toda essa Lisboa, do
Castelo até Benfica e arredores, para prazer dos pobres e remediados, a quem,
se lhes eram negadas iguarias de maior requinte, restavam, no entanto, estes
prazeres. Destas singelezas tenho hoje mais saudades que das lagostas dos
casamentos ou das bisnagas de “paté de foie” vindas do “estrangeiro”, com que a
minha tia Maria Helena fazia umas deliciosas sandes em fino e delicado pão de
forma, que então se comiam com a magia dos sabores novos.
Só quem
não compreende o prazer de molhar o pão, limpar o prato dos deliciosos
vestígios, ou mesmo rapar a frigideira depois de servir todos os esfaimados, é
que pode ficar impávido ao ver tais prazeres degustativos desaparecerem aos
poucos, entre regras de educação, normas de higiene, falta de memória ou apenas
o azar de não ter tido uma infância com bom pão e panelas onde fumegassem
guisados e outras suculentas maravilhas. Entre estas, incluo o molho da salada
de tomate (aquilo que fica na saladeira quando acaba a salada), que é tão bom
que já me aconteceu fazer a salada só para chegar a esta parte, mas cada um tem
as suas maluqueiras.
Raymond Blanc preparando essência de tomate, que na verdade é um molho de salada mais elaborado |
Quantas vezes acontece que depois de descascar
camarões, as cascas acabam no lixo, quando têm tantas possibilidades, incluindo
fazer-se um azeite de camarões, que na verdade não passa de cascas fritas com
alho, uma pequena malagueta e um toque final de sumo de limão. E molhar o pão
nisto?
PS: Depois de ter escrito isto, li o texto doZine do Pão onde o autor escreve e justifica,
que o pão anda mal por cá. Deve ter
razão, mas ainda encontro pão capaz de me animar, como alguns pães da zona de
Tavira, mas pode ser que a miséria do panorama lisboeta me faça rejubilar com qualquer coisinha melhor. No entanto só os conheço de
comer e não sei como são feitos.
Será talvez altura de dizer que o pão é fraco,
mas o molho não estava mau.
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