14/10/2015

Memórias - Sandes de molho

Para os meus companheiros desses dias: Manel, Carlos, Albano e Paulo

No tempo em que um bilhete de eléctrico custava 1$00 e eu ia a pé ou à "penda" para guardar esses dez tostões. No tempo em que gastava as solas a jogar à bola, e ouvir telefonia era levado a sério. No tempo em que comecei a sair de casa depois de jantar para ir ao café do Manel (quase em frente à minha porta) para beber uma bica. No tempo dos primeiros namoros, dos primeiros discos e da descoberta da pide e das ideias proibidas.
Nesse tempo em que eu cresci e foi felizmente interrompido e modificado pelo 25 de Abril de 1974, havia muitas coisas que recordo com saudade e me fazem sorrir, mesmo se são consequência dum modo pobre de viver, onde não se desperdiçava quase nada e tudo tinha valor.



No largo de S. Tomé, que fica perto do Castelo, no caminho entre a casa dos meus pais e o "meu" Liceu Gil Vicente, havia (não sei se ainda há, pois da ultima vez que aí passei decorriam grandes obras no edifício) um daqueles cafés que tinha, logo à entrada, as famosas frigideiras das iscas e das bifanas. O café metia-me algum medo, pois era frequentado por homens duros e mal encarados, que se embebedavam a qualquer hora e jogavam à chapinha frente à porta, na curva onde começa a calçada de Sto. André. Tinha também aquele aroma que vinha das frigideiras em estado permanente de fritura e algumas vezes entrei para pedir uma sandes de molho, que me fazia companhia na subida da calçada da Graça.

A dita sandes era apenas uma carcaça, aberta ao meio e mergulhada num dos molhos à escolha. Não me lembro do preço, mas sei que era uma delícia que, imagino, já não se sirva nesta cidade de turistas, comidas embaladas e apertada segurança alimentar.

Não me vejo a cantarolar "oh tempo volta pra trás", mas tenho a certeza que as sandes de molho nunca foram fascistas

2 comments:

  1. Julgo que as sandes de molho eram as verdadeiras "iscas sem elas "

    ReplyDelete
  2. Sim, é isso ou uma versão melhorada do "pão com cheiro"

    ReplyDelete