Olho.
Vejo ou penso que vejo.
Acredito, sigo, decido, engano-me, quero ser iludido, quero…
e ainda só olhei.
Vejo ou penso que vejo.
Acredito, sigo, decido, engano-me, quero ser iludido, quero…
e ainda só olhei.
Olho as frágeis gambinhas
da costa de Tavira, que apareceram ontem no mercado e deixo-me
tentar:
- Leve que são óptimas
e estão baratas, chegando Agosto não se podem comprar!
Eu fingi pensar, mas já
tinha decidido. Sabia do que se tratava e os cuidados necessários
para não dar cabo dos bichos. Decidi logo ali que faria um caldo
claro com as cascas e daí viria o único calor necessário para uma
ligeiríssima cozedura. A peixeira continuava a falar:
- A minha cunhada está
cá e eu quero que ela prove esta nossa especialidade....
Consommé foi a palavra
irritante que me apareceu no meio da cabeça. Não foi para me armar,
até porque estava a falar sozinho, é o nome que conheço, mas
gostava que a minha Língua tivesse todas as palavras que me faltam,
mesmo que muitas delas só existam noutras Línguas.
Quando atrás escrevi
“caldo claro” pensava em consommé. Esse caldo límpido, cheio de
sabor, que tantas vezes pensei ser uma perda de tempo, pois dava
trabalho e não ficava mais saboroso. Mas fica mais bonito e os olhos
gostam de novidades e depois habituam-se.
Fiz o meu primeiro
consommé há menos de um mês, porque o meu filho me ligou a pedir
que lhe fizesse um de camarão que depois seria incorporado num
xarope, que usaria nuns cocktails, para uma festa. A ideia pareceu-me
parva (camarões e açúcar?) e disse-lhe que era capaz de fazer mas
não me parecia bom.
O consommé ficou lindo, e
lá fiz o xarope, que me disse depois o rapaz, ficou como ele queria.
Ainda bem. Comigo ficou a vontade de repetir e foi desta.
Com as cascas das gambas,
uma chalota em meias luas, um talo de aipo, 4 raízes de coentros,
água e sal fiz um caldo. Depois de ter fervilhado um pouco, juntei 3
claras de ovo e mexi ligeiramente. Os sólidos vão-se juntando à
clara e as impurezas vão também aderindo. Pouco depois passei tudo
por um filtro de café e assim obtive um caldo transparente.
Piquei em cubos pequenos,
1 chalota, 10 cm de talo de aipo, ½ cenoura, 1 colher de café de
gengibre fresco e juntei-lhes 1 colher de café com sal, o mesmo de
açúcar, 2 colheres de sopa com vinagre (usei vinagre de arroz que
veio comigo de férias) e 1 com água. Neste líquido macerei os
vegetais durante 30 minutos.
Para servir, aqueci o
caldo, distribuí as gambas descascadas pelos 2 pratos de sopa (doses
generosas), escorri os “pickles”, juntando-os às gambas, cobri
com o caldo bem quente e acabei com um pouco de pimanta preta,
coentros frescos e aneto (na véspera tínhamos comido um ceviche de
dourada na Noélia e eu ficara com o gosto do aneto na boca. Como
havia aneto na praça, comprei e usei).
Ficou muito bom e estas
gambas, que se dão mal com grandes calores, cozem assim apenas o suficiente,
para darem o seu melhor.
Os olhos procuram sem
descanso. Hoje vi lagostins e comprei. Estou a pensar num azeite
feito com as cascas, uns dentes de alho, um pouco de piri piri...
nada ajillo/ao alhinho/à guilho, mas quase (só que não).